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Médicos, políticos e juristas falam sobre isolamento social e mais medidas de combate à pandemia

Um vídeo, não finalizado, de uma campanha publicitária com o slogan “O Brasil Não Pode Parar”, começou a ser veiculado na semana passada, em que um narrador citava diversas categorias profissionais, como autônomos e prestadores de serviços, e repetia diversas vezes que o país não pode parar por eles. No próprio Instagram do Governo Federal, uma publicação com a hashtag #OBrasilNãoPodeParar dizia que são raros os casos de vítimas fatais do coronavírus entre jovens e adultos e que, por isso, somente idosos e integrantes de grupos de risco devem ficar em casa – contrariando a orientação do Ministério da Saúde, que prega o isolamento total para toda a população, exceto os trabalhadores de serviços essenciais. Em resposta, a Justiça Federal do Rio de Janeiro proibiu, no dia 28 de março, a União de divulgar a campanha publicitária, com multa, em caso de descumprimento, de R$ 100 mil.


Em entrevista ao Portal Health Connections, o advogado Guilherme Romano afirmou, com relação às competências dos poderes e o limite de atuação do Executivo, que é preciso fazer valer a chamada função social do Direito, ou seja, o equilíbrio entre as convicções pessoais do governante e a aplicação da legislação, bem como a preservação dos maiores bem tutelados, dentre os quais, a vida humana. Portanto, para o advogado cabe, sim, ao Judiciário o controle de atos de natureza pessoal, de modo a garantir tal função social.


Sobre a política de isolamento social e a situação brasileira diante da pandemia, o médico e ex-ministro da Saúde (2007-2011), José Gomes Temporão, alerta que Henrique Mandetta, atual ministro da Saúde, é e deve ser a autoridade sanitária máxima e que devemos respeitar seus posicionamentos. Não faz sentido, segundo o ex-ministro, que o presidente da República “sem qualquer conhecimento da ciência, sem estudo ou evidência científica”, se pronuncie, nesse momento, de forma contrária à autoridade de saúde, como aconteceu quando Jair Bolsonaro relativizou o isolamento total e defendeu a necessidade de volta ao trabalho por parte dos brasileiros que estão fora dos grupos de risco.


Temporão comenta que a atuação do ministério da Saúde, por enquanto, vem sendo pautada pela competência e pelo rigor técnico científico, baseada no que preconizam organismos internacionais, a Organização Mundial da Saúde e a Fundação Oswaldo Cruz. Aponta, no entanto, que “infelizmente, o que deveria ser um comando coeso e unitário para enfrentamento de uma situação extremamente grave, vem tendo no presidente da República um contraponto negativo, colocando em risco a segurança do país e a vida dos brasileiros”.


O ex-ministro destaca que 5% dos casos de contaminação por COVID-19 evoluem para pneumonia graves, o que demanda a necessidade de respirador, leito de CTI, uma equipe de profissionais de saúde – e, por isso, é muito importante o isolamento social para reduzir a velocidade de disseminação do vírus, permitindo o preparo e a organização do sistema de saúde para receber esses pacientes graves. Segundo ele, o isolamento vertical não tem evidência científica nenhuma, “é pura demagogia e irresponsabilidade”. Temporão acrescenta que, em uma situação como a da sociedade brasileira, com imensa desigualdade social e com pessoas morando em comunidades insalubres, aglomeradas em casas minúsculas, não há lógica no pensamento de que seria possível isolar os idosos e liberar as outras pessoas da casa.


Temporão destaca também que vivemos um momento em que a sociedade brasileira reconhece a importância do Sistema Único de Saúde (SUS) e a necessidade de um sistema de saúde que atenda a todos e por isso precisamos rever seu financiamento e sua garantir a sustentabilidade financeira. “Seus profissionais devem ser respeitados e bem remunerados”, acrescenta, lamentando a perda de investimento que o órgão sofreu nos últimos anos.


A estimativa das perdas orçamentárias do SUS acumuladas entre 2018 e 2020 é de R$ 27,5 bilhões, em consequência da regra do teto de investimentos públicos – Emenda Constitucional 95, aprovada em 2016, que dispõe que o piso de investimentos para a saúde fica, a partir de 2018, congelado no valor de 2017 (15% da Receita Corrente Líquida – RCL – nos termos da EC 86), passando a ser atualizado apenas pela inflação do período.

Temporão também afirma que é preciso enxergar a ciência como investimento, para que, em uma pandemia e momento crítico como este que vivemos, o Brasil não dependa de soluções de outros países, que demandam tempo e muito dinheiro.


Ações de enfrentamento à pandemia


Em conversa com o Portal Health Connections, o deputado federal Luiz Antônio Teixeira Júnior, médico, presidente da Comissão Externa sobre Coronavírus da Câmara de Deputados e ex-secretário de Estado de Saúde, comentou que o não isolamento da população brasileira causaria o caos em nosso sistema de saúde. “Nenhum sistema de saúde no mundo está preparado para lidar com o número de doentes que haveria sem essa política de isolamento total, pela alta velocidade de transmissão viral”, declara.


Segundo o Teixeira, o governo federal está equivocado quando decide se pronunciar ou fazer uma campanha sobre o coronavírus de forma isolada – sem o apoio do Ministério da Saúde, incentivando por exemplo o isolamento vertical. “Hoje nós temos os exemplos de campanhas pedindo a volta da população as ruas em outros lugares do mundo – como na Itália, que se mostraram completamente equivocadas e causaram o cenário devastador que estamos vendo hoje, de muitas mortes diárias e um colapso do sistema de saúde. Relativizar o isolamento, nesse momento, no Brasil, é um equívoco sem precedentes”, afirma o médico.


Teixeira acredita que o isolamento social, assim como a testagem massiva da população, são medidas decisivas, que podem mudar os rumos e as perspectivas no país. Para reforçar essas estratégias, a ANVISA aprovou, no dia 29 de março, 17 testes rápidos. Entre as demais medidas da Câmara para combate à pandemia, uma delas, que já foi aprovada no dia 1º de abril, com vetos, pelo presidente Jair Bolsonaro, é a que estabelece um auxílio de R$ 600 mensais, por três meses, para trabalhadores informais e que pode se estender a duas pessoas da mesma família. No caso de mães que sejam chefes de família, o valor pode chegar a R$ 1.200.


Teixeira afirma ainda que um dos projetos de leis principais votados pela Câmara é o 668/20, que determina a proibição da exportação de materiais e equipamentos essenciais, como respiradores e ventiladores mecânicos e de equipamentos de proteção individual, durante a pandemia. Tal projeto já foi aprovado pela Câmara e aguarda sanção do presidente da República. O deputado também cita o PLP 232/19, do qual é coautor, que libera recursos não utilizados que estão parados nos Fundos de Saúde de estados e municípios para o combate à Covid-19, o que pode injetar até R$ 6 bilhões na Saúde. O projeto também aguarda agora sanção presidencial.


Outro projeto que será votado pela Câmara e seguirá para apreciação do Senado permite a importação de equipamentos de proteção e medicamentos e insumos que já tenham sido validados pelo FDA, EMA ou outra agencia reguladora internacional, sem requerer aprovação pela ANVISA – a agência brasileira terá de liberá-los em até 72h. Atualmente, o órgão leva de 490 a 1.286 dias para registrar medicamentos no Brasil.



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